Ave Candeias (V): os videos

Tantas décadas depois dos institucionais dos anos sessenta, Candeias volta a fazer um institucional em 1993 sobre a Cinemateca Brasileira. Trabalho de encomenda, em plena “Era Color”, em que o cinema brasileiro estava reduzido a zero, e logo após ver seu O Vigilante passar praticamente “em branco”, Candeias faz um filme sutilmente subversivo. Por trás da narração acadêmica sobre as atividades da Cinemateca, Candeias mostra o seu abandono, focando as centenas de latas que provavelmente nunca seriam identificadas (o destino fez com que fossem, graças a um grande censo possível mediante recursos do Ministério da Cultura) e o sombrio “entorno” físico da Cinemateca, que constrasta com os seus jardins, ainda que abandonados. Abandono da Cinemateca como espelho de um abandono de um cinema brasileiro, sinal implícito de decadência e desesperança, mensagem subversiva colocada no filme para quem estiver de olhos atentos.

Bastidores de um Filme Pornô também coloca um paradoxo na sua estrutura: feito com fotos dos bastidores de uma filmagem, congela os movimentos, tornando o ato sexual uma coisa distante, praticamente sem tesão. O ritmo lento de exposição da fotos, o curta estático sem variações (é praticamente uma sequência de fotos), a música (seria árabe?) estranha ao clima do filme, fazem de todo o curta uma espécie de anti-clímax. Novamente aqui entram, de forma implícita, os temas da decadência e do abandono, quase sinalizando a sobrevivência possível de um cinema brasileiro que se empenha para subsistir mas sem muito orgulho de si mesmo.

Lady Vaselina é um trabalho de uma oficina de teatro mas mostra que, quando possível, Candeias é um apaixonado pela experimentação, em testar novos limites e possibilidades para a sua linguagem. Tendo como base um estilo teatral completamente dissociado da sua filmografia mais típica, numa locação em um canto de teatro “puro” (sem cenografia, sem objetos de cena, isto é, sem nada), o material de base é um texto de Tenessee Williams (ou seja, um texto teatral, a coisa mais atípica da filmografia de Candeias!). O curta se passa numa suposta pensão, em que a dona cobra o aluguel de uma das locatárias do local, sendo ajudada por um jovem escritor que ao final se revela ninguém menos do que Tchecov! Todo filmado em closes, num único plano sequência, com pequenos deslocamentos e variações de foco instigantes, Lady Vaselina, além do deboche típico de Candeias, é formidável por seu teor de experimentação com o vídeo, que revela o estilo visionário do diretor mesmo num projeto extremamente modesto de nítidas limitações de produção (aliás, a regra nos filmes de Candeias…).

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