Juno

Juno
De Jason Reitman
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O surpreendente novo queridinho do cinema independente americano utiliza a questão da diferença para falar do mesmo: o drama da gravidez na adolescência da menina Juno, rebelde, independente mas ao mesmo tempo carente e indefesa, é na verdade um percurso de amadurecimento, ou ainda, o processo para que ela seja “uma pessoa como qualquer outra”. Toda a trajetória do filme é para um amaciamento da relação de rebeldia de Juno, seja com ela mesma seja com relação a seus pais. Se por um lado isso faz com que Juno seja um filme humano sobre uma menina em que “cai a máscara” de sua auto-suficiência para uma nova etapa em que ela entenda melhor os seus limites e se aceite de forma mais completa, por outro não esconde o perfil conservador e apaziguador que é a tônica do filme.

Querendo simular uma linguagem ágil, especialmente com os recursos das histórias em quadrinhos – como vemos na sequência de abertura do filme –, e com o uso da música, Juno o faz mais por meio de artifícios de roteiro do que efetivamente por querer utilizar uma “linguagem mais jovem”. Dessa forma, o filme tem uma estrutura perfeitamente de cinema clássico, em termos de enquadramento, movimentos de câmera e pontos de virada do roteiro. O que pode nos surpreender é a suposta agilidade dos diálogos de Diablo Cody – a ex-stripper que ganhou o Oscar de melhor roteiro pelo filme –, e que torna o filme tão pessoal que hoje, é impossível não pensarmos que o filme é mais “dela” do que de seu diretor Ivan Reitman. No entanto são esses mesmos diálogos a coisa que mais me incomodou durante o filme, com sua mania de querer o tempo todo mostrar sua suposta originalidade, além de ter uma estrutura de trocadilhos muito afeitas aos seriados de TV americanos. A direção de Reitman é muito discreta, apostando nos planos médios e nos ambientes fechados que ele caracteriza iguaiszinhos aos seriados americanos. O grande mérito de Juno, o que poderia explicar seu sucesso, é o desprendimento da personagem, representado com desenvoltura por Ellen Page. O filme vai retratar o processo de gravidez na adolescência sem querer vitimizar a personagem e sem passar lições de moral. A convicção da menina em ter o filho mas não criá-lo (pois não tem “maturidade” para isso) é a chave do “viés apaziguador” do filme, sem falar no final, nitidamente conciliador (novamente a família). O jeito franco, objetivo e desbocado de Juno constrasta com o que no fundo é uma carência afetiva, e quando o filme desenvolve isso tem os seus melhores momentos e escapa do marasmo. Em relação a mostrar de forma bem-humorada os dramas “de uma questão real que aflige milhares de meninas”, o que posso dizer é que o filme é uma espécie de “gravidez na adolescência for dummies”, e tudo é tão inconsequente que o filme poderia provocar para um aumento dos casos e não para a redução ou para ao alerta (como se a função do cinema fosse essa…). Por fim, é curioso como o filme se encaixa de forma ambígua num cinema de gênero entre a comédia romântica e a “screwball comedy”, o que no fundo acaba dando no mesmo.

Por fim (agora mesmo), quando se comparam dois filmes que falam de problemas dos adolescentes norte-americanos como Juno e Paranoid Park, é muito fácil perceber de que lado se está. Juno não tem tempo de mergulhar nessa personagem: tudo já é dado de antemão pelas situações de roteiro (em geral engraçadinhas) que se multiplicam de forma esquemática como se fosse um programa de TV. Em Paranoid Park há um mundo ambíguo em que esse jovem descobre algo que ele não conhece e o diretor e a mise en scene do filme mergulham nessa dúvida para tentar encontrar rastros de um processo. Enquanto Juno se esforça para “resolver um problema”, em Paranoid Park há um clima de reflexão em que se sugere que tentemos “compreender os sintomas de uma angústia”.

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