A garota da fábrica de fósforos

A garota da fábrica de fósforos

De Aki Kaurismaki

DVD, sab 15

* ½

 

É muito interessante ver os filmes do Kaurismaki do início dos anos noventa pois vemos um cineasta em formação. O seu olhar em O Homem Sem Passado e em Luzes na Escuridão é bem mais amadurecido em relação a filmes como Nuvens Passageiras (que já abordei por aqui – ver http://cinecasulofilia.blogspot.com/search?q=nuvens+passageiras ) e este A garota da fábrica de fósforos, um filme de 1990. Mas o que é curioso neste singelo trabalho é que o embrião do cinema do Kaurismaki está todo lá: como as questões sociais se misturam com as questões individuais numa mise-en-scene que foge do realista e que busca, ao invés disso, um tom de fábula; como a miséria da vida se expressa através de personagens mudos ou silenciosos; como a simplicidade da encenação e das soluções de narrativa prenuncia um cinema que valoriza a decupagem e os tempos de reação dos personagens. Mas aqui, ao contrário do cinema de O Homem Sem Passado em diante não há a ambigüidade: a menina boazinha é capturada por um sistema injusto que, implicitamente, gera as condições para um ato malvado, e essa personagem não vai conseguir se adaptar a ele. Esse tema poderia nos lembrar de L´Argent de Bresson, ainda mais pela extrema economia de recursos cênicos de Kaurismaki. Mas aqui há a diferença: no fundo Kaurismaki o faz para apelar para os nossos sentimentos e compaixão com o drama da protagonista, enquanto as motivações de Bresson sempre permanecem difusas e há um distanciamento da psicologia. Quando Kaurismaki busca essa “secura” e não apela para psicologia, o filme fica muito forte, como fica claro no belíssimo início do filme, mostrando a rotina das máquinas que fabricam os fósforos numa fábrica. Tudo está ali: a tecnologia poupadora de mão-de-obra que reflete a desumanização do processo produtivo e de toda uma estrutura de sociedade. E ali, o primeiro plano da protagonista ganha uma força, porque sua solidão e seu deslocamento são visíveis, quase num paralelo a Tempos Modernos, de Chaplin. Fica também, como característica do cinema de Kaurismaki, essa opção por um cinema de decupagem, ainda que sem a consciência do décor e da mise-en-scene de um Nuvens Passageiras, por exemplo. Por isso, o trabalho com o silêncio e todo o tom singelo que envolve o filme é muito positivo. Mas, enfim, o filme ainda está aquém do melhor trabalho de Kaurismaki que iria despontar cerca de dez anos depois.

Comentários

Anônimo disse…
onde foi filmado?

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