Sabiaguaba

Dos Irmãos Pretti

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Uma das maiores notícias dos últimos dias foi a seleção de Sabiaguaba para a competitiva do Festival de Oberhausen. Inédito no Brasil, o novo trabalho de Luiz e Ricardo Pretti comprova que no Brasil o que é divulgado e o que dá certo é a opulência da produção (e da fotografia) ou o tom “Zorra Total”, mas que nos festivais internacionais há de fato a possibilidade de divulgação de um cinema que busque novas propostas de linguagem. O caminho então é esse.

 

Sabiaguaba é uma continuação e uma ruptura com os trabalhos anteriores dos Irmãos Pretti. Por um lado, a linguagem descontínua, o cinema de referências, a narrativa de tempos mortos e espaços fragmentados, a produção simples e os diretores como atores continuam lá. Mas aqui, desta vez, esse mesmo olhar parece renovado. Daí a dificuldade de se falar de Sabiaguaba.

 

Em primeiro lugar, Sabiaguaba é um filme sobre não ser, sobre não estar lá, ou sobre uma ausência. Sobre ser estrangeiro. Dois irmãos gêmeos brancos perdidos num vilarejo do Nordeste, como se fosse uma comédia de equívocos. Eles procuram por pessoas que não estão lá, e esperam algo acontecer.

 

Mas no intervalo entre essa espera e essa ausência existe a vida, e as coisas continuam. Uma certa melancolia, um certo cansaço, uma ironia carinhosa em relação a essa falta de possibilidades, de perspectivas. Mais dias em branco.

 

Em Sabiaguaba há uma visão crítica do turista, do estrangeiro que está num Nordeste outro e não pode ter nada dali. Quase como o cinema do Jarmusch que fala de pessoas que viajam aparentemente em busca de novidades mas que no fundo continuam fazendo as mesmas coisas que faziam em casa. Um filme que mostra esse percurso confuso, esguio. Um filme de processo, em que o próprio processo de se estar nesse percurso é o resultado em si. Um filme atrasado em relação às coisas, já começando pela montagem, antecipada sempre em 14 frames (ou coisa do tipo). Um filme que revela, indiretamente, uma enorme maturidade ao compor uma profunda crítica em relação aos rumos que esses próprios realizadores resolveram dar à sua vida.

 

Deslocamento de um espaço físico e íntimo. Ausência de uma geografia, das pessoas do local e de si mesmo. Enfim, um cinema que olha essa solidão imensa como grande matéria-prima do mundo, mais do que ainda a ser moldada, que está para ser descoberta a cada instante. Mas o que me encanta em Sabiaguaba é que, diferentemente de um Estética da Solidão, agora parece ser possível dar um abraço carinhoso e um sorriso de canto de boca em tudo isso, nessa grande “screwball comedy” que é a nossa vida. Sem perder a ternura, mas acima de tudo sem perder o rigor.

Comentários

CFagundes disse…
Nobre Ikeda!

Como diriam no texas, long time no see...
Ví o site do Oberhausen, o filme dos prettis que lá ví selecionado era "As vezes é melhor lavar a pia do que a louça", ou vice-versa. Se for o mesmo filme com outro título, prefiro Sabiaguaba, que belo nome! Passei o dia dizendo Sabiaguaba...
Abraços,

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