auto-revisão crítica

Dei um leve sorriso quando ontem revi DEPOIS DA NOITE. Sim, um sorriso pela ingenuidade do tema, pela falta de rigor da câmera e do mise-en-scene, pelo total desconhecimento do mais básico da gramática cinematográfica, pela incapacidade de dirigir um ator. Mas ao mesmo tempo, é impressionante o efeito que esse filme provocou em mim, e especialmente porque todo o meu cinema já estava lá (e assim torna-se um belo primeiro filme, porque confirma muitas das coisas que eu espero que um “primeiro filme” seja). O menininho preso a seu quarto, o final cíclico, a falta de palavras, os dias que se seguem, a solidão e a incomunicabilidade, o austero estudo psicológico dessa intimidade, o desejo pela linguagem, são todos constantes dos trabalhos que vim fazendo, em maior ou menor grau. Também notei como é impressionante a semelhança desse filme com O POSTO, ou mesmo com CINEDIÁRIO. O guarda de O POSTO é o menininho de DEPOIS DA NOITE, ambos presos em seu casulo, ambos vítimas de um campo de forças invisíveis contra o qual se chocam involuntariamente, ambos em processo de uma tomada de consciência, ambos vítimas de uma rotina que se repete interminavelmente. E o menino de DEPOIS DA NOITE é o artista de CINEDIÁRIO, vivendo sempre em casa e olhando, indefeso, o mundo lá fora como uma alternativa de saída, como inspiração possível para uma vida que não se tem, como um desvelamento de uma intimidade. DEPOIS DA NOITE mostra algumas (poucas) virtudes que vim desenvolvendo com mais consistência nos meus trabalhos posteriores, e isso é um bom sinal, é o sinal de um caminho. O principal vício é a da falta de acabamento, é a do cinema como artesanato, e isso eu ainda tenho que caminhar, e muito. Mas já há um esboço consistente de um projeto de cinema, desde lá.

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