INFILTRADO NA KLAN



INFILTRADO NA KLAN
de Spike Lee




O tom subversivo do filme de Spike Lee está na sutileza e na frontalidade com que ele afirma seu jogo duplo, como já está expresso diretamente no título do filme, INFILTRADO NA KLAN (na tradução em português). De um lado, o título se refere ao enredo literal – um policial que se infiltra na KKK. Mas a “infiltração” pode ser vista em vários outros sentidos. Ou seja, quem se infiltra? E quem é a Klan?

Pois, por outro lado, o filme mostra um militante negro que se infiltra na polícia branca racista. Com isso, Spike Lee, de forma provocativa, questiona sobre as estratégias da militância negra em defender a sua pauta: é preciso não apenas combater o sistema de fora, denunciando suas incongruências, mas adentrar no sistema e transformá-lo por dentro, ocupando o espaço da hegemonia. O policial negro, então, usa as regras e normas do sistema opressor a seu favor, para combater a KKK, ainda que sofra, entre seus companheiros de profissão, o mesmo racismo que a instituição supostamente busca combater.

Mas existe ainda outro ponto. O intruso é também o próprio diretor Spike Lee, infiltrado no modelo dos grandes estúdios hollywoodianos e indicado ao Oscar (é um filme produzido pela Focus Features, distribuído em todo o mundo pela Universal). A linguagem clássica, o uso de recursos pop, o diálogo consciente com certo cinema de entretenimento/espetáculo não reduzem o tom subversivo do filme, mas, ao contrário, é uma parte coerente de sua estratégia de endereçar o filme não apenas para espectadores negros do cinema de autor mas abrir o discurso do filme para o maior número possível de plateias, inclusive brancos racistas, infiltrando-se no campo inimigo, atacando-o diretamente mas com sutileza e estratégia.

Esse humor e essa ironia são a grande contribuição política do filme de Spike Lee, e é o que o faz imensamente subversivo.

Exemplo disso foi quando, na cerimônia do Oscar, a BBC (um canal de TV britânico) perguntou ao cineasta o que ele achava de GREEN BOOK ter ganhado o prêmio de melhor filme – um filme considerado racista por não poucos. Lee, de forma brilhante, respondeu para o canal sobre o filme com a frase “it´s not my cup of tea!”. Com humor, deixou claro que não gostava do filme mas sem entrar em muita polêmica desnecessária. E, usando um termo tradicionalmente britânico, de um ambiente conservador radicalmente diferente do universo desse americano do Brooklyn, deu uma zoada com grande classe no entrevistador.

Spike Lee era um infiltrado no Oscar.


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