esses pequenos passos silenciosos
meus amigos,
ontem foi um dia muito feliz! queria agradecer a todos que
compartilharam esse momento, que foi o de jogar essa garrafa no mar e vê-la
desaparecer. um momento para mim muito especial e marcante, em que pude colocar
ali para fora e para dentro de mim uma série de coisas que vem acontecendo em
mim, na minha vida, na minha forma de ver/estar no mundo nos últimos três anos.
ENTRE MIM E ELES, esse filme silencioso, é um filme sobre o cinema, sobre o
cinema brasileiro, um filme sobre a amizade, um filme sobre a encenação no
cinema, e, claro, também um filme sobre mim. porque só consigo falar de tudo
isso na medida em que isso me afeta, e quando isso me afeta me vem um desejo
tamanho de responder a isso lançando coisas no mundo. partindo de coisas que me
movem e de coisas que me incomodam. quem vem acompanhando meus pequenos passos
silenciosos pode perceber que eles vão lentamente ganhando outras proporções.
esses pequenos passos silenciosos. fiz uma série de filmes em que me filmo
minha casa, fiz um conjunto de cartas e também fiz outros filmes-diários,
diários de viagem. Mas agora, em ENTRE MIM E ELES, passa a ser um pouco
diferente. diferente porque há outras coisas em jogo. há as pessoas. sempre fui
muito cauteloso em me aproximar das pessoas. mas em alguns dos meus últimos
trabalhos, especialmente nos meus exercícios diários depois que vim para
fortaleza, me vi nessa tarefa mekiana de filmar meu dia-a-dia e isso passa por
um encontro com as pessoas, por um cotidiano dessa forma de viver-artista que é
o que me contagia em fortaleza. e isso transformou (vem transformando)
ligeiramente o meu olhar. há uma coisa bonita no epílogo de ENTRE MIM E ELES.
de novo eu me filmo em minha casa, como nos meus vídeos caseiros. mas aqui há
uma coisa que desloca essa condição. esse epílogo basicmamente mostra um
movimento, um gesto, de abandonar esse casulo. de sair do meu apartamento e ir
para a cidade, para o mundo. de sair da pia do banheiro de minha casa e ir para
o mar. é claro que ENTRE MIM E ELES é um filme solitário sobre um filme
coletivo, e esse gesto não é filmado aos moldes do que propõe OS MONSTROS muito
menos aos moldes do cinema documentário ou num registro naturalista - esse
epílogo é completamente artificial e posado, uma performance. ou seja, um
desejo, um porvir, mais do que algo que se dá de fato. é um gesto. um gesto
precário. eu me coloco ali nesse filme - como em alguns outros - me olhando de
frente não de uma forma egocêntrica mas de uma forma extremamente frágil.
fiquei profundamente tocado quando o felipe rodrigues reagiu de forma indignada
dizendo que este filme não podia ser chamado de precário, que a palavra
precariedade tem que ser evitada, que não há nada de precário nesse meu filme,
ao contrário. mas não a uso por modéstia, mas por uma convicção franciscana de
que o único caminho para chegar até a ti (até a mim mesmo) é escancarar essa
fragilidade. entendo os que veem esse filme como uma declaração fria ou formal,
mas no fundo meu processo de construção desse filme passa muito mais pelo
coração do que pela mente. esse filme é uma carta, é uma declaração de amor. se
ela parece muito fria, é pelo meu tom desajeitado, pela minha falta de talento
em escancarar esse casulo e declarar de forma aberta esse amor que sinto pelo
mundo. ou então pela tristeza em sentir que esse amor muitas vezes não é correspondido, pelo menos como eu esperaria.
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