OS SEM ESPERANÇA
DE MIKLOS JANCSO
MAM, SAB 20 16HS
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é incrível como eu não me lembrava desse OS SEM ESPERANÇA, já que o revendo para mim ficou claro como ele se alinha à minha proposta de o posto.
o que me impressionou profundamente é a sua atualidade, especialmente alguns momentos que venho passando.
É um filme sobre como o sistema esmaga os populares, por uma ingenuidade: a ilusão de poder.
O sistema incita os populares a não se unirem, a uns delatarem os outros.
O que oferece em troca: o poder e uma ilusão de liberdade.
É o eterno final de Le trou, de Jacques Becker.
Então que é um filme profundamente político e profundamente ético, sobre como as pessoas são tolas, como elas vencdem os seus princípios por uma tola ilusão.
A ilusão de fazerem parte do sistema, enquanto o sistema no fundo usa as pessoas para seu bel-prazer, e quando elas não servem mais, o sistema as joga fora.
E como essa "sedução do poder" é usada para reafirmar o poder, o sistema.
E isso é muito atual, e isso é o que eu queria trabalhar em o posto, e é isso o que eu tenho vivido atualmente na minha vida, e tenho tentado resistir contra isso.
Mas como Jancso encena isso:
com um cinema libertário, livre, com um deslumbrante cinemascope em preto-e-branco, com um profundo senso de linguagem, alternando entre os planos gerais e os planos prõximos, com movimentos de câmera delirantes e com um intenso movimento dos atores no interior do quadro.
com tempos alongados, que estimulam a reflexão do espectador, com base na declaração das pessoas, que o tempo todo não sabemos até que ponto são verdades ou mentiras é como agente triplo, o filme do rohmer o filme todo é em cima das aparências, das superfícies ilusórias, mas fazendo um profundo corolário ético da inutilidade de tudo isso esse corolário ético forte fica claro quando as pessoas se jogam de cima das torres, quando os oficiais começam a torturar as mulheres em troca de uma confissão onde vai parar tudo isso: e o suicício desesperado, a morte.
muito bonito esse filme do jancso.
e, claro, esse corolário ético está no título, que é uma declaração de princípios do que está em jogo com o filme: OS SEM ESPERANÇA.
Os "populares" se confundem com o "sistema": ambos gostam dos jogos de poder e querem a sua "ascensão social"
e o cinema de jancso faz isso nos desorientando: não sabemos com quem simpatizar, os "personagens de destaque" em geral são filhos da puta, são os traidores.
o filme mostra como a revolução é impossível porque no fundo as pessoas sao traidoras, querem seu bem-estar pessoal ao invés do coletivo.
É uma metáfora, passada num tempo passado para ilustrar o presente.
a historia é mais "confortavel" que o presente, como diria nao sei quem.
as locações, os figurinos, fazem com que essa "fábula" assuma uma conotação quase surrealista: um certo toque de humor inclusive, mas um humor duro, uma ironia tipicamente da Europa Oriental.
um filme kafkiano às avessas: a lógica desse regime de tudo parecer sem lógica, e o desespero patético dos "populares" para "serem aceitos".
um filme profundamente atual, um filme político, um filme de invenção, grande filme esse do jancso.
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