(FESTRIO) The Wayward Cloud
The Wayward Cloud
De Tsai Ming-Liang
São Luiz qua 19hs
***
Na verdade vou escrever algo sobre o filme só pra não deixar em branco, já que foi um dos melhores filmes do Festival, mas por incrível que pareça meu ânimo para escrever sobre ele é pouco, já que é difícil falar sobre o filme. Gosto de dividir a filmografia de Tsai em dois pólos: o da comédia e do drama. Essa classificação é ridícula porque os dois nos filmes de Tsai são unidos, mas no primeiro coloco O Buraco e The Wayward; no segundo, Vive L´Amour e A Hora da Partida. O Rio está no meio dos dois, talvez mais próximo do primeiro. Mas, enfim, creio que este The Wayward esteja mais próximo de O Buraco, na forma como Tsai trabalha o humor e com uma situação-limite. O engraçado é que enquanto O Buraco falava de um vazamento de água, em The Wayward fala de uma seca, de uma falta d´água.
Só que a comédia de Tsai é sempre muito triste. Seus filmes são sempre impregnados de uma terrível melancolia diante do mundo e das coisas, e sua poesia é irônica, brutal, imprevisível. Sorrimos de forma constrangida diante dos filmes de Tsai. Seus filmes sempre falam de um desconforto diante do mundo, de um sentido agudo de deslocamento.
O perigo de The Wayward é cair nos clichês do cinema de autor, é repetir os mesmos recursos de efeito dos filmes anteriores do diretor, e de fato, há alguns cacoetes no filme que reduzem seu impacto expressivo, nos passam a impressão do “já-dito”, do “já-visto”. Ainda assim, é um grande prazer “reassistir” um novo filme de Tsai, porque sua sabedoria em manejar a linguagem é admirável. The Wayward é feito de “esquetes” quase soltas, que se amarram de forma muito tênue para um arremedo de narrativa, mas o que fica são algumas esquetes, e a sensibilidade do diretor para criar climas (um casal dormindo num balanço de praça, pegando caranguejos, cozinhando, servindo suco de melancia, fumando debaixo da mesa, etc). Por outro lado, há um humor brutal, relacionado às seqüências de sexo. A cena na locadora em que o ator pornô rechaça o sexo oral de sua companheira é muito intenso, e muito bonito. Mas brutal. Um longo plano seqüência, como aquele que abre o filme de forma chocante, o sexo com a melancia.
Mas nada poderia nos fazer crer que Tsai iria tão longe em seu final. Ali há a síntese do cinema de Tsai e uma das cenas mais dolorosas e mais intensas do cinema contemporâneo. Um plano-síntese: a atriz morta, o ator cumprindo mecanicamente seu dever, o cinema registrando esse momento quase mórbido, tentando extrair algum prazer daquela situação sinistra. Do outro lado da parede, uma espectadora, estática, boquiaberta, angustiada. A necessidade do contato e a distância entre as pessoas. O cinema entre eles. E uma parede. Tudo está ali. A mulher começa a ter prazer vendo ali o seu namorado transando com uma mulher morta. É o contato possível.
De Tsai Ming-Liang
São Luiz qua 19hs
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Na verdade vou escrever algo sobre o filme só pra não deixar em branco, já que foi um dos melhores filmes do Festival, mas por incrível que pareça meu ânimo para escrever sobre ele é pouco, já que é difícil falar sobre o filme. Gosto de dividir a filmografia de Tsai em dois pólos: o da comédia e do drama. Essa classificação é ridícula porque os dois nos filmes de Tsai são unidos, mas no primeiro coloco O Buraco e The Wayward; no segundo, Vive L´Amour e A Hora da Partida. O Rio está no meio dos dois, talvez mais próximo do primeiro. Mas, enfim, creio que este The Wayward esteja mais próximo de O Buraco, na forma como Tsai trabalha o humor e com uma situação-limite. O engraçado é que enquanto O Buraco falava de um vazamento de água, em The Wayward fala de uma seca, de uma falta d´água.
Só que a comédia de Tsai é sempre muito triste. Seus filmes são sempre impregnados de uma terrível melancolia diante do mundo e das coisas, e sua poesia é irônica, brutal, imprevisível. Sorrimos de forma constrangida diante dos filmes de Tsai. Seus filmes sempre falam de um desconforto diante do mundo, de um sentido agudo de deslocamento.
O perigo de The Wayward é cair nos clichês do cinema de autor, é repetir os mesmos recursos de efeito dos filmes anteriores do diretor, e de fato, há alguns cacoetes no filme que reduzem seu impacto expressivo, nos passam a impressão do “já-dito”, do “já-visto”. Ainda assim, é um grande prazer “reassistir” um novo filme de Tsai, porque sua sabedoria em manejar a linguagem é admirável. The Wayward é feito de “esquetes” quase soltas, que se amarram de forma muito tênue para um arremedo de narrativa, mas o que fica são algumas esquetes, e a sensibilidade do diretor para criar climas (um casal dormindo num balanço de praça, pegando caranguejos, cozinhando, servindo suco de melancia, fumando debaixo da mesa, etc). Por outro lado, há um humor brutal, relacionado às seqüências de sexo. A cena na locadora em que o ator pornô rechaça o sexo oral de sua companheira é muito intenso, e muito bonito. Mas brutal. Um longo plano seqüência, como aquele que abre o filme de forma chocante, o sexo com a melancia.
Mas nada poderia nos fazer crer que Tsai iria tão longe em seu final. Ali há a síntese do cinema de Tsai e uma das cenas mais dolorosas e mais intensas do cinema contemporâneo. Um plano-síntese: a atriz morta, o ator cumprindo mecanicamente seu dever, o cinema registrando esse momento quase mórbido, tentando extrair algum prazer daquela situação sinistra. Do outro lado da parede, uma espectadora, estática, boquiaberta, angustiada. A necessidade do contato e a distância entre as pessoas. O cinema entre eles. E uma parede. Tudo está ali. A mulher começa a ter prazer vendo ali o seu namorado transando com uma mulher morta. É o contato possível.
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