Edukators / Bungalow


Edukators, de Hans Weingartner (Alemanha, 2004)
Bungalow, de Ulrich Kohler (Alemanha, 2002)


Penso aqui em dois filmes, ambos alemães, realizados neste século por diretores estreantes para tentar entender o que são “filmes políticos” e “filmes jovens”. Duas expressões, duas palavras muito em voga. Edukators é o que se poderia pensar de um filme tipicamente político e de um filme tipicamente jovem. É um filme sobre um grupo de jovens que querem fazer a revolução, vendo um mundo de injustiças e tentando agir da sua forma para corrigi-las (um filme de ação). Acredita-se que o mundo não é como se gostaria que fosse, e os personagens buscam mudá-lo mas sem agressão física, apenas “assustando” os opressores. Invadem casas e pregam peças, até que são pegos, não pela polícia mas por um dos habitantes. Em paralelo a “fazer a revolução”, há um triângulo amoroso, típica estrutura em duas partes da narrativa clássica (a trama principal e a trama amorosa, que se superpõem). O princípio da não-agressão é a base não apenas dos personagens, mas estratégia de encenação do próprio filme, para que os espectadores se identifiquem com esses “rebeldes pop”: Edukators propõe uma “revolução pop” para divertir as plateias pequeno-burguesas, levarem a uma consciência crítica das distorções do mundo mas sem perturbá-los, indigná-los, ou seja, sem levar a uma ação, mas simplesmente acomodar sua insatisfação. É exatamente o oposto do que Brecht já tinha identificado como o espírito do teatro revolucionário (arte revolucionária): evitar a identificação do espectador com os personagens, gerar distanciamento através de um estranhamento, buscar uma arte física contra a mera emoção catártica, etc. Se o discurso de Edukators é a busca por uma revolução, ela não é visível através das imagens ou da encenação: não há nada além das imagens, não há desejo, não há desconforto.

Já Bungalow poderia ser visto como um filme apolítico a partir de sua própria trama: um jovem deserda o exército. Mas não deserda com um mirabolante plano de fuga, ele simplesmente acontece por acaso, numa incrível sequência de abertura do filme. Ele não deserda porque possui “princípios antibelicistas”, mas simplesmente porque quer ficar em casa “sem fazer nada”. Bungalow é um filme de guerra, mas que guerra é essa? Ele não quer fazer a revolução, mas isso não indica que ele seja contra a agressão: ele agride seu irmão, a si mesmo, etc. Ele simplesmente quer ficar em paz, mas não consegue. Quer amar mas não consegue. Não faz atitudes corretas, não atrai a simpatia do público: é atrevido, preguiçoso, impertinente, quer roubar a namorada do irmão. Por outro lado, esse rapaz vive. E o filme não o julga, mas procura olhar para esse menino, viver com ele, acompanhar esse percurso meio mórbido meio lúdico, essa aventura desse menino buscando ser. Essa é a política de Bungalow: a política de buscar ser à margem do exército, à margem da sociedade, à margem da família, e talvez à margem de si mesmo. Confuso, com atitudes contraditórias, esse menino insolente tenta viver em liberdade e obviamente não consegue. A política do cinema do estreante Ulrich Kohler é seu olhar humanista, já que o filme “busca olhar como o homem se engaja na prática de sua existência” (roubando a expressão como o Júlio Bezerra pensa o cinema do Tsai), e isso é tudo, e esse ato é político e jovem, ousado e revolucionário. Essa é também sua juventude e sua atualidade: dessa confusão surge sua força, exatamente a partir de seu deslocamento do mundo. O menino de Bungalow não quer fazer a revolução, as imagens de Kohler não buscam a contemplação romanesca (o esvaziamento do plano) do protótipo do cinema de arte: essa é a política e a juventude desse desconcertante Bungalow, ao contrário do didatismo farsesco da “revolução pop” de Edukators. Nos dois filmes, os jovens não gostam do mundo como ele é, mas enquanto em Edukators existem respostas definidas, com oposições marcadas, e a injustiça vem sempre “do outro”, em Bungalow as respostas são difusas, as fronteiras são borradas, e o filme tenta descobrir com o personagem. Irrita e incomoda o público, mas quem se detiver um pouquinho mais para além das máscaras do personagem e do próprio filme, vai descobrir um filme/personagem apaixonado. Bungalow é no fundo uma história de amor.

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