Menina de Ouro

Menina de Ouro
De Clint Eastwood
Estação Paissandu, qua 13:40
*1/2

E justamente nesse instante de fragilidade – física e emocional – a companheira de sempre: o cinema. Entrar no Paissandu completamente vazio já me deu uma sensação de conforto espiritual: era como se eu estivesse entrando em uma Igreja. E o filme era justamente o tão aguardado Menina de Ouro, em que eu já estava mais que pronto para desaguar todas as minhas carências.

Mas não foi o que se viu. Apesar de todas as expectativas, Menina de Ouro para mim ficou aquém. É nítido o esmero do diretor no trato com a narrativa clássica, a habilidade em combinar seus elementos, o viés humano e o tom intimista com que confere ritmo ao filme, mas tudo isso já se esperava no cinema de Clint Eastwood, vistos seus últimos trabalhos.

Mas não dá para evitar: Clint faz um cinema passadista, e transforma a nostalgia e o sentimento em medo de se enfrentar os desafios do futuro. Menina de Ouro vira um dramalhão, entre Rocky e O Campeão. Decerto que a ambigüidade de uma América sombria na busca de um lugar ao sol torna o filme um canto de lamento contra um cinema hollywoodiano cada vez mais previsível e de encomenda. Acontece que o cinema de Eastwood quer resgatar a mesma América de sempre. Seu cântico é meramente reformista, arraigado às mais profundas tradições desse cinema e desse país. A lutadora na grande final vem da “Alemanha Oriental”, é uma ex-prostituta que só ganha porque luta sujo, representada como a verdadeira corporificação do mal, contra a linda garçonete que oferece a casa para a mãe oportunista, e por aí vai. “Sempre se proteger, sempre se proteger”, a grande lição de moral que ressoa nos ouvidos de uma América alarmada contra a invasão de terroristas que “jogam sujo”.

Quando o filme investe fundo no dramalhão, vemos a sensibilidade de Eastwood nos tempos e na economia do campo-contracampo, e como o diretor mergulha de cabeça em temas pesados como a eutanásia sem se deixar intimidar, mas a verdade é que Menina de Ouro se alonga muito mais que o necessário, tornando seu corpo desequilibrado mesmo diante da narrativa clássica que o autor quer tanto se filiar e preservar. Menina de Ouro também deixa de lado vários dos dilemas da menina lutadora para compor climas em louvor a um tempo que já se foi, de uma memória perdida que já se desfez, o que já o torna um dos mais melancólicos e tristes filmes dos últimos tempos do cinema americano, ainda que preocupado com a construção de uma “moral” e com a preservação de suas instituições. Clint poderia ser Ozu se refletisse melhor sobre os desafios de seu tempo, se ao invés de se lamentar sobre as contradições de seu tempo, buscasse transcendê-las, mas na verdade é o novo John Ford do cinema americano. Para o bem e para o mal. Que assim o seja.

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